O que vem depois do perdão?
- tainaseixas
- 25 de abr. de 2024
- 2 min de leitura
O presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, pediu perdão pelos inúmeros crimes cometidos pelo país durante a colonização do Brasil, em especial contra povos indígenas e negros sequestrados da África para serem escravizados no Brasil. As desculpas, já muito tardias, são necessárias e muito bem-vindas, mas e agora?
Rebelo foi o primeiro a admitir que essa é a parte mais fácil e só isso não basta. A escravização de pessoas no oceano Atlântico foi iniciada por Portugal e culminou em 4,9 milhões de pessoas africanas trazidas à força ao Brasil para serem escravizadas, resultando no maior tráfico do tipo nas história. Quando falamos dos povos originários, os números não são menos aterrorizantes. A estimativa é que 70% da população nativa da época foi morta, seja pelo tratamento violento e desumano dado ou decorrente das doenças trazidas da Europa.
Rebelo falou em reparação mas, por ora, é só isso mesmo. Ele mesmo não tem poderes executivos e decisórios para isso, o que cabe ao primeiro-ministro português a quem ele diz ter feito essa "sugestão". Meu palpite é de que isso nunca acontecerá - embora eu torça muito pelo contrário - e que vamos ficar só nas desculpas que já promovem um grande impacto na narrativa dominante, pouco interessada em responsabilizar pessoas e instituições que cometeram crimes. A razão disso é simples,
A colonização é, ao meu ver, o maior crime da história da humanidade uma vez que engloba todos os mais terríveis crimes nos quais eu consigo pensar: genocídio, tortura, racismo, escravização, estupro, roubos, estupros, exploração, evangelização, preconceitos, negação de direitos e da autonomia do corpo e toda a rejeição e tentativa de extermínio de culturas vivas e diversas. Um pacote pesado como esse afeta - e muito - a história de pessoas, famílias e de um projeto de nação que a partir da invasão portuguesa começou a ser construído. Para isso, não há reparação. Mas alguma coisa precisa, sim, ser feita. Eu começaria com indenizações exorbitantes a todas as pessoas negras e indígenas no Brasil, além da devolução de tudo que nos foi gatunado e ainda podem ser devolvidos.
Parte crucial da reparação, no entanto, é alterar a trajetória. O estado brasileiro e a população brasileira também devem atuar, mas também não estão interessado em reparação porque a colonização segue em curso. A carne mais barata do mercado ainda é a carne negra, como cirurgicamente entoou Elza Soares; os povos indígenas ainda estão sendo atacados pelos interesses econômicos do agronegócio, da mineração e do comércio da madeira; as mulheres brasileiras não têm autonomia sobre o próprio corpo e a polícia brasileira atua de forma fascista em territórios onde as comunidades são pobres.
Basta lermos as capas dos jornais para ver quão distantes estamos dessa interrupção do ciclo de violência e sabemos que parte da razão disso é porque tal cólera está entranhada em nós culturalmente. Somos parte do problema e depende de nós mudar o futuro. Precisamos aprender a pedir perdão, que não tem efeito prático se for apenas declamação de uma palavra. E essa reparação depende também de nós. O que você está fazendo no seu cotidiano para reparar os crimes da colonização?


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